“A tropa está doente, desmotivada e ninguém faz nada”. Policiais militares de Campo Grande denunciam que estão sendo vítimas de perseguição por parte de seus superiores, principalmente quando o assunto é ‘saúde mental’. As denúncias chegaram ao Jornal Midiamax após a publicação da matéria que fala sobre a prisão de um policial que havia solicitado licença para fazer tratamento psicológico e foi acusado de ‘não querer trabalhar’.
Outras denúncias apareceram, todas com pedido de preservação para não haver retaliação.
Um policial militar lamentou que o ocorrido com o colega que acabou preso aconteceu na semana em que o FAF (Fundo de Assistência Feminina) da PM realizou seminário sobre saúde mental. “Nada adianta obrigar as praças a participar desse tipo de evento, se os comandantes continuam com o mesmo pensamento arcaico”, explicou.
Outro policial contou que os oficiais estão ‘forçando’ o pessoal de rua a cumprirem escalas e serviços que não suportam. “Fazem sob o pretexto de reforçar o policiamento da área. Estão fazendo os policiais chegarem à exaustão. Os oficiais mesmo não atendem ocorrência em viatura”, conta. “Depois que um tenente é promovido a capitão já não trabalha mais nas ruas”, explicou.
Ainda segundo o policial, são usados vários argumentos para impedir que o servidor saia para tratamento. “Quando o policial não aguenta mais a carga de serviço e pede ajuda, os oficiais usam de suas prerrogativas e do regulamento disciplinar para enquadrar e punir seu subordinado. Tudo sob égide do militarismo”.
Os servidores reclamam ainda que as associações de praças têm conhecimento das situações, mas nada é feito. “Jogam no interesse próprio correndo atrás de benefícios pessoais enquanto a tropa sangra. Temos colegas com depressão, síndrome de Burnout, síndrome do pânico, mas ninguém realmente se importa. A campanha do Setembro Amarelo é só no papel”, lamentou.
Outro policial questionou como podem atender a população com educação e o trato que merece. “Nem ao menos podemos pedir ajuda, não podemos dizer que estamos precisando de ajuda”, reclamou. Outra reclamação é que o plano de saúde aumentou. Teve um reajuste de 5% para a categoria esse ano, porém o plano de saúde aumentou o desconto, sendo este maior do que o reajuste salarial. “Hoje ganhamos menos do que antes do reajuste que o governo concedeu”, disse. “A tropa está doente, desmotivada e ninguém faz nada”, afirma.
O supervisor, acusado também de perseguição, e que prendeu o policial que pediu licença médica, é um tenente que, inclusive, tem passagens por violência doméstica. “Esse homem é o terror dos subordinados”, descreveu outro servidor.
“Ele é um abusador da sociedade, dos subordinados e da esposa”, disse outro policial.
Um militar relatou que também tem sido perseguido. “Eu já fui transferido 9 vezes. Três vezes em um único mês. A lei diz que podemos ser transferidos apenas uma vez por ano”, explicou. Ele ainda afirma que o Brasil tem a polícia que mais comete suicídio.
“Precisamos que esses policiais antigos, do tempo da ditadura, com mentalidade arcaica e violenta, sejam aposentados ou sejam submetidos a reciclagem mensal de adequação constitucional para que se submetam ao novo ordenamento jurídico pátrio, o qual preza pelos direitos humanos de todos os cidadãos, inclusive, do próprio policial militar, que é uma pessoa humana”, detalhou.
A reportagem tentou contato com a Aspra (Associação de Praças da Polícia Militar e Bombeiros Militares do Mato Grosso do Sul), via e-mail e telefone, para saber sobre as denúncias de perseguição e sobre os policiais que estão sob tratamento psicológico, mas até esta publicação não obteve retorno. O espaço segue aberto para futuras manifestações.
Sobre as escalas apertadas, a Polícia Militar explicou que a jornada é padrão e foi alterada a pedido das associações que representam os policiais. Antes, a jornada era de 12 horas diurnas trabalhadas, para 24h de descanso e 12 horas noturnas para 48 de descanso. Agora a escala é de 24 horas de trabalho por 72h de descanso.
Ainda segundo a PM, raramente o policial é escalado em alguma atividade durante suas horas de descanso, com exceção de alguma solenidade ou formatura, porém é esporádico.
Em alguns casos a escala é diferenciada, como, por exemplo, do policial militar ambiental, com missões e se desloca em pontos distantes, faz patrulha em rios, fazenda, mas o período de descanso é respeitado.
“Na Capital essa escala é padrão para quem trabalha no serviço operacional”, finalizou.
Prisão e pedido de licença médica
Um policial militar foi preso na sexta-feira (29) acusado de ‘não querer trabalhar’ quando pediu licença para tratamento psicológico.
O policial havia sido cedido para a Assembleia Legislativa e quando retornou ao batalhão passou a ser humilhado na frente da tropa. Por não aguentar mais, pediu permissão para ir ao FAF (Fundo de Assistência Feminina) porque precisava de apoio psicológico, no entanto, recebeu voz de prisão.
O comandante teria negado o pedido dizendo que o policial ‘estava com preguiça e não queria trabalhar e por isso então ia ser preso, porque na prisão não trabalha’.
Ele acabou preso por recusa de obediência, cuja pena máxima é de dois anos, mas foi liberado em audiência de custódia.
Durante a liberação, o juiz ordenou que ele e o tenente não mantenham contato e por isso, um dos dois deve ser remanejado. O policial foi liberado para voltar ao trabalho com acompanhamento psicológico.